terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O estranho






      "Imagine que uma pessoa que morou com você some da sua vida sem dar satisfação,  e depois de mais de uma década volta, como se nada tivesse acontecido?
      Você pego no susto, o que faria? A receberia de volta de braços abertos? Será que ainda há esaço para ela em sua via?      

      O que ele pensava que aconteceria? Tocando a campainha de minha porta após catorze anos que fora embora? Que saíra de casa, dizendo que nosso casamento não era o que ele esperava? Ele que não hesitou nem um segundo. Ele que não reconsiderou sua decisão ao menos uma vez, mesmo comigo implorando, chorando, pedindo:

      - Por favor, fica! Vamos tentar de novo!

      O que ele pensava que aconteceria? Que eu abriria a porta feliz pelo reencontro? Radiante e sem mágoa? Será que ele pensou que eu havia esquecido, que ele perdeu-se no mundo e nunca mandou noticias? Ou que nunca quisera saber como eu ficara depois de sua partida? O que ele pensava? Que eu tivesse congelado minha vida por catorze anos esperando por este dia, onde ele arrependido da decisão precipitada voltaria?

      Ele tocava a campainha com a mesma cara deslavada de outrora. A mesma cara de confiança de que tudo seria como ele queria. Aquele cachorro descarado, que desculpa planejara me dar? O que ele me diria? Pediria um copo d’água? Um café? Puxaria assunto sobre o passado? Solicitaria minha ajuda? Pouso na antiga casa com a antiga esposa? O que queria? O quê?

      A cama de casal em que dormíamos, fora trocada há doze anos atrás, por conta de meu novo casamento, junto com quase toda a mobília. O quarto de visitas que ele usava para ficar sozinho, fora reformado para dormir os meus dois filhos. As roupas, sapatos e outras coisas que ele deixou e nunca voltou para buscar, eu doei há muitos anos. Até a casa tinha uma cor bem diferente do dia em que partira.

      Agora, aquele homem que tocava a campainha era um estranho. A minha casa, a minha família e até mesmo a mim, que nunca conhecera de verdade a pessoa com quem casara. Por isso eu fiz o que tinha que fazer. Fiz o que era certo, e não me arrependo. Despachei-o do portão, sem nem mesmo abrir-lo.

      Eu não o deixaria entrar em minha vida novamente.


Kátia Pessoa – 21/02/2011




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