quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Tchau e bença





"Pessoas não são objetos que descartamos depois que estão velhos. E até objetos quando possível devem ser reciclados." 


      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Você vai ter que ficar sozinha. Em casa ou em um quarto alugado, se preferir. Longe de mim! Pode ficar em um asilo, se quiser. Com outros velhinhos. Que estão lá para não atrapalhar a vida dos filhos. 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Você precisa aprender a se virar sozinha. Sem filho do lado. Você tem que entender que não pode ser um peso, mãe. Não pode atrapalhar a vida dos outros! Você já foi jovem, mãe. E escolheu o que quis fazer. E escolheu ser mãe. Ter a mim. Cuidar de mim. Eu nunca escolhi cuidar de você, mãe! Nunca escolhi ter uma velha ao meu lado. Que não gosta quando não como. Que não gosta quando bebo. Que não gosta quando fumo. Que não gosta de meus amigos. Que não gosta de meu namorado! 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Por isso não apareça para me visitar, mãe. Sem avisar. Sem combinar antes. Tá? Para não atrapalhar. De preferência, venha só se for chamada. Não tem espaço nesta casa para você, mãe. O espaço já está reservado. Para meus amigos e namorado. 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Eu tenho minha própria vida, mãe. E agora estou cuidando dela. Já não te peço mais ajuda, mãe. Por isso não peça a minha. Por isso trate de cuidar da sua saúde, mãe. Para não ficar doente. E não ter como se virar sozinha. E dar trabalho aos outros. E me dar trabalho. Se você ficar doente e precisar, mãe, até te visito. Te dou uma sopa, um remédio. Faço um pouco de companhia. E só, mãe! E só! Nada de voltar a morar juntas de novo. 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Não tenho mais idade para morar com a mãe. Já estou crescida. Sou mulher feita. Até bem madurinha. Preciso agora cuidar da minha vida. Ter uma casa só minha. Minha liberdade. Para viver como bem quiser. Receber em meu espaço quem me aprouver. 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Você atrapalha, mãe! Incomoda! Com essa sua carência que pede companhia. Com essa sua depressão. Esse pedido de atenção no olhar. Essa vontade de estar perto de mim. Você é chata, mãe! E não se manca. Não percebe que quero ficar sozinha. Livre. Sem peso de mãe. Nem de filhos. Quando engravido os tiro! 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Obrigada por tudo que fez por mim, mãe! Eu me lembro de você sair correndo comigo para o hospital, toda vez que eu passava mal. Ficava doente. Isso era frequente, não é mãe? Eu te dei muito trabalho. Eu sei! E agradeço pelas inúmeras vezes, em que foi na minha escola conversar com os professores. Perguntando por que eu não aprendia. Ou porque sempre brigava com os amiguinhos. Obrigada por isso, mãe! E obrigada por ter trabalhado como louca naquela fabrica. Saindo de manhã e voltando só de noitinha. Para conseguir dinheiro para pagar o aluguel e comprar comida. Para pagar meu colégio depois que o pai morreu. Ele morreu jovem, não é mãe? Às vezes penso que foi melhor assim. Deus sabe o que faz! Não deu tempo dele ficar velho. Sem poder trabalhar. Vivendo só de aposentadoria. 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Você vai ficar bem, mãe. A senhora é forte. Vai saber se virar sozinha. Ou vai ter que aprender. Assim é a vida, mãe! Isso comigo também vai acontecer. Ou eu não vou esperar para ver. Saio da vida antes disso. Sei lá! Daqui a alguns anos penso no que vou fazer. 

      Mãe, você não combina com meu estilo de vida. Por isso não pode morar comigo! 

      Eu preciso ir embora agora, mãe. Marquei de ir em um barzinho. Encontrar meus amigos e meu namorado. Eles são minha prioridade agora, mãe. Não posso mais ficar aqui com você.

      Bença, mãe! Estou indo embora.

      Fique aí em seu quarto. Boazinha e sozinha. 


Kátia Pessoa – 24/01/2013



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