"Ainda temos no Brasil muitas pessoas racistas, que consideram que pessoas negras são inferiores as brancas. Este argumento que foi usado pelos brancos para escravizar os negros, hoje serve para justificar a desigualdade social entre brancos e negros, como se os negros fossem os culpados por não terem as mesmas chances que uma pessoa branca."
- Pai, sabe o Beto? Aquele meu amigo da
faculdade que te apresentei no clube? Ele está precisando trabalhar. O senhor
não tem uma vaga para ele lá na fabrica?
- Jeferson, eu não gostei dele.
- Não gostou dele por que, pai? Ele é meu
amigo faz tempo! É gente boa! De confiança!
- Jeferson, vou ser bem sincero com você:
eu não quero que você se envolva com gente como ele!
- Como assim, pai? Gente como ele?
- Gente de cor, Jeferson!
- Pai, isso é racismo. Racismo é crime,
sabia? Crime inafiançável!
- Jeferson, eu falo isso por que vejo na
televisão e leio jornais. Quase toda noticia de roubo, homicídio, tráfico que
eu escuto falar foi cometida por alguém como ele: marrom. As cadeias estão aí
para comprovar! Toda vez que fazem reportagem e mostram os presos, o que é que
a gente vê? Gente de cor como seu amigo Beto! Por isso não contrato negros. É
melhor não arriscar. A malandragem tá no sangue desta gente!
- Pai, você não percebe o absurdo que
está falando? Você está julgando todos os negros como bandidos, só por causa de
reportagem na televisão e noticia de jornal!
- Esses veículos de comunicação mostram a
verdade, filho! Essa gente não é de confiança! Por isso é que eu não deixo nem
empregada negra trabalhar nesta casa.
- Pai, o Beto estuda. Faz faculdade comigo
e é um dos melhores alunos da classe. Os professores têm o maior respeito por
ele. E o Beto sempre trabalhou. Não é bandido não!
- Você só conhece ele da faculdade, filho.
Não sabe o que ele faz quando não está lá. E ele pode até ser um rapaz bom como
você diz, mas, e a família? A gente não pode facilitar, filho!
- Pai, eu conheci a família do Beto e é
tudo gente honesta!
- Como “conheceu a família dele”?
- O Beto me convidou a para festa de
aniversário da mãe dele. Eu conheci a família dele as pessoas do seu bairro. E
é tudo gente de bem! Viu, senhor Noberto?
- Quando foi isto, Jeferson?
- Faz uns dois meses.
- Você não voltou mais lá, não foi?
- Voltei sim, pai! E para ser bem sincero
com o senhor, estou apaixonado pela irmã do Beto e vou pedi-la em namoro.
- Você está brincando comigo, Jeferson?
Eu não permito que você namore uma negra!
- Eu não estou não pedindo autorização
para o senhor, pai! Estou só comunicando que se a irmã do Beto aceitar namorar
comigo, eu vou namorá-la sim! Ela é linda, inteligente, estuda jornalismo... Se
aceitar namorar comigo vou ficar muito feliz!
- Atreva-se a namorar uma negrinha que eu
te coloco para fora desta casa! Não te dou nem mais um centavo, nem mesmo para pagar
a sua faculdade!
- Caso não saiba, senhor Noberto, por lei
o senhor é obrigado a custear meus estudos até que eu complete 24 anos. Pare de
pagar e eu entro com uma ação na justiça. Esta é uma causa perdida para o
senhor, além de pegar muito mal junto a seus clientes. Acho que eles vão perder
na credibilidade no senhor e na sua empresa. Sem contar que tem o dinheiro que
minha mãe me deixou!
- Ora, seu moleque! Ainda bem que sua mãe
não está viva para escutar uma coisa dessa...
- Ela ia ficar muito decepcionada com o
senhor!
- Saia da minha frente. Saia da minha
frente já!
- Amanhã mesmo eu vou começar a procurar
um emprego. Pretendo sair o mais rápido possível desta casa!
- Por acaso você está pensando em
trabalhar e estudar? Acha que vai conseguir? Você só estudou a vida toda, não
vai dar conta de fazer os dois agora!
- Tem muita gente que trabalha e estuda,
pai. O Beto e a irmã dele sempre fizeram isto. Se eles conseguem eu posso conseguir
também!
...
...
...
...
-
Já vou indo, pai.
-
Vou esperar você quebrar a cara e voltar arrependido, me pedindo desculpas!
- Pai, não tem mais como eu ficar nesta casa.
Somos muito diferentes e só brigamos. Eu já devia ter ido embora viver a minha
vida há muito tempo...
Fique com Deus, pai! Se cuida, tá? Eu
mando noticias.
Kátia Pessoa – 02/10/2012
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